1 de dezembro de 2007

REFLEXÃO

O Trinco da Porta

Na porta do pátio de um lavrador, há muito que faltava um trinco.
O lavrador, quando entrava ou saía, nunca se esquecia de encostá-la; mas ninguém mais tinha o mesmo cuidado, e por isso a criação andava sempre a fugir para o campo, e as cabras e ovelhas a entrar no pátio e até dentro de casa, o que, além de arreliar, fazia perder muito tempo.
Mas o lavrador, todas as vezes que a mulher o aconselhava a comprar um trinco, respondia:
- Ele faz falta, lá isso faz; mas custa oito euros, e esse dinheiro também me faz muita falta.
Continuava a porta sem trinco, e eis que uma bela manhã foge o melhor porco do chiqueiro e safa-se por ela direito a um matagal, que havia lá fora, no campo.
Um dos filhos do lavrador ainda o bispou e disse em altos berros: - Lá vai o porco! Lá vai o porco!
Ouviu-o o pai na cavalariça, onde estava prendendo à majedoura o cavalo preto, e deixou-o logo para correr atrás do porco.
A mulher fez o mesmo à roupa, que engomava na cozinha, e desatou a correr atrás do marido.
A filha, que ao pé da lareira mexia a sopa, desatou a correr atrás da mãe.
E atrás de todos, enfiaram também, numa corrida doida, o filho e o criado.
Na azáfama em que este corria, não mediu bem a largura dum valado, escorregou e torceu um pé. O lavrador, a mulher, o filho e a filha não tiveram outro remédio senão acudir-lhe; e os dois homens trouxeram para casa, de charola,o pobre rapaz, que murmurava:
-Ai! o meu pé! Ai! a minha perna! Tinha também escalavrado uma canela.
Na cozinha sentiram um cheiro muito forte a roupa queimada. Havia saltado uma brasa do ferro de engomar para a melhor camisa do lavrador.
E a sopa estava perdida, com esturro!
Furioso contra a mulher e a filha, o lavrador correu á cavalariça, lembrando-se do cavalo preto.
Andava á solta, e com uma parelha de coices acabava de partir uma perna ao jumento.
Ainda mais: o criado esteve quinze dias estirado na cama, mas ganhando dinheiro ao patrão, que teve de fazer-lhe a obrigação mais o filho.
E tudo porque a tempo não se tinha gasto oito euros com o trinco da porta!

Sem comentários: